SEM AULA E SEM SALÁRIO
Por: Ruy Medeiros.
Gosto de Bertold
Brech, mesmo quando seu nome vem escrito como Bertolt. Quando se trata de
violência sempre me vem à mente versos que já repeti e que continuarei
repetindo:
Do rio que tudo
arrasta
se diz violento
Mas não se dizem
violentas
as margens que o
comprimem.
Paulo Cesar de
Souza traduziu os versos de forma diferente:
A corrente
impetuosa é chamada de violenta
Mas o leito de rio que o contém
Ninguém chama de violento.
A lembrança de Brecht vem por conta da atual greve
dos professores da rede pública estadual. Por quê?
Leio, vejo e ouço: Governo e seus preprepostos
manifestam seu repúdio, seu desconforto e decepção com o fato de milhares e
milhares de jovens estarem sem aula, e justificam o corte de salários dos
nossos professores (nossos, sim, leitor). Tudo isso me violenta, e creio que
agride a inteligência de muitos.
Se o governo estivesse mesmo preocupado com os
jovens estudantes não teria deixado as coisas atingirem esse nível. A verdade é
que o Estado não possui, nem implementa, política de educação que reverta o
atual quadro. Ao invés disso, escolas são fechadas (vide, dentre outros os
casos das Escolas Dirlene Mendonça e Maria Viana), o ensino público perde
qualidade, pais se sacrificam e colocam seus filhos em escolas de rede privada.
Também o Estado não tem política que pense no professor seriamente. Este é
encarado como qualquer um (daí vem os contratos REDA), e não como responsável
por instituição que pretende vincular pessoas e sociedades ao futuro (a
aprendizagem sempre será utilizada no futuro) e que, por isso, é necessário à
própria existência de todos nós. Não é algo que seja descartável ou
improvisado.
Mas há uma onda perversa (mesmo!) que se revela nos
momentos de greve: a tentativa de jogar professores contra a sociedade,
denunciando que aqueles deixam crianças sem aulas, sem merenda, etc. Isso é
revelador: uma sociedade contra o professor ou que o desprestigia não é
sociedade que queira educação e o Estado que usa tal expediente compromete a educação.
O leitor por certo não gostaria de ser educado por pessoas repudiadas pela
sociedade. E é isso que o Estado quer dizer: não acredite neles (portanto não
acredite na rede pública de ensino), assim será melhor para encher a rede
privada, para fechar as escolas, para violentar o futuro ( o futuro é sim
violentado, quando se violenta potenciais).
Esse discurso , que compromete a educação é
violência contra todos nós, pois nos condena a ver a sociedade presa aos
interesses privativistas em matéria de ensino e assistir o caráter desse ser
dobrado em direção àquele mesmo ensino já denominado de maceteiro (que
substitui com galas a “decorebagem” ). Mas compromete o ensino à medida que
desqualifica os principais agentes desse. Isso pode surtir efeito político
imediato. O Estado diz que os professores são culpados, desqualifica-os, mas
com isso comete crime contra a educação. Está visto.
Em verdade, os salários achataram-se. Escolas foram
fechadas ou sucateadas. Salas foram reunidas. E, nesse momento, em que laços de
solidariedade e mudanças no seio das famílias dificultam o trabalho do
professor, que precisa ter condições para bem desempenhar seu ofício, precisa
estudar para entender esse seu novo alunado, formular estratégia, ver o que
pode dar certo para dotar os educandos de instrumentos de autonomia para
continuar estudando.
Mas aí está a greve. Apesar do desejo do Estado de
jogar a sociedade contra os professores, isso não ocorreu, a sociedade não
protestou, por dois motivos principais, eu penso (sei que há outros): a) os
pobres a quem a desastrada educação pública passou a ser destinatária (os menos
pobres já estão na escola particular) não se sensibilizaram porque percebem que
lutar contra miséria dos outros é combater contra sua própria miséria; b) já não
vê grande efeito no tipo de educação oferecido pelo Estado e imposta aos
professores como seu modo de fazer(como, aliás, parece ser desejo de
governantes).
Por outro lado, a greve não cresce por seu estilo
sindical. Os professores não entenderam ainda que sua luta exige um novo tipo
de greve: referenciada na sociedade, com a sociedade, formulando projeto, que
também seja desta, - de educação para todos, com mais destinatários e sem fuga
de estudantes, uma educação que para os pobres não aponte apenas a misera
contribuição do bolsa família ou do benefício assistencial. Urge construir
comitês, em cada lugar, de defesa e transformação da educação pública. O
horizonte deve ser mais largo. Afinal, como dizia Cazuza – “meus inimigos
estão no poder. Ideologia, preciso de uma prá viver”.
1 comentários:
A nossa luta é justa, LEGAL e política á medida que é natural do ser humano conviver em sociedade, necessitar promover o bem comum e a felicidade de todos, ideias de Aristóteles. Portanto, qual educando queremos formar? Espero que cidadãos que saibam viver em sociedade, lutando por seus direitos e cumpridores de seus deveres. A falta de habilidade do governo em sentar para negociar e a nossa dita “intransigência” se explica pelo histórico de lutas dos personagens, mas não se justifica ou aceita a falta de competência dos gestores em mediar à situação, prejudicando alunos, professores, sociedade, e também, o processo educacional. Luta por aplicação de leis tambem faz parte do processo educacional, portanto, os gestores têm por obrigação fazer a tarefa de casa e cumprir a Lei do Piso. A própria lei mostra como complementar o orçamento.
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